Opinião

Nas entrelinhas: o que diz na verdade o decreto da Igreja da Paraíba sobre possíveis abusos sexuais? - Por Francisco Airton

Foto: reprodução – Arquidiocese

As medidas extremadas adotadas pela igreja da Paraíba após os recentes possíveis envolvimentos de religiosos com práticas de abusos sexuais contra crianças e adolescentes, nos levam a muitas reflexões. Apesar de sabermos que tal prática por parte da igreja (ou de membros dela) já se tornou corriqueira – dada as muitas denúncias registradas ao redor do mundo inteiro – ainda nos chocamos e conseguimos nos indignar com os crimes que vez por outra vem à tona aqui ou além fronteiras!

Ninguém pode atribuir tais fatos como “sinais dos tempos” por que as denúncias são antigas. Afinal, os abusos praticados por clérigos contra crianças inocentes e adolescentes desavisados ou crentes demais datam de eras bastante remotas e desde então são práticas realizadas na calada da noite ou no claro do dia, muitas vezes, com o aval de autoridades religiosas, que ao longo do tempo vem passando a mão nas cabeças dos seus protegidos num misto de proteção e conivência, onde em alguns casos a prática, também é perpetrada pelos próprios superiores!

Terrível ter que falar assim, não é mesmo? Mas a divulgação do Decreto assinado pelo arcebispo, Dom Manuel Delson Pereira, no qual proíbe aos padres a “companhia de menores e de adultos vulneráveis, desacompanhados dos seus pais ou responsáveis, na Casa Paroquial, no carro paroquial ou em outros ambientes reservados”, fala por si só! Do contrário haveria a possibilidade de tais determinações? Mesmo que se explique que esse é na verdade um documento de uso interno da igreja e que já seja do conhecimento da ordem a algum tempo, constrange a população católica como um todo! Quem jamais imaginou que religiosos seriam considerados companhias perigosas (ao invés de protetoras) as pessoas mais fragilizadas?

A verdade é que, por muito tempo, pais e mães, católicos fervorosos confiaram seus filhos (meninos e meninas), adultos depressivos ou parentes em situação vulnerável, à companhia de membros da igreja, tidos até então de condutas ilibadas e caráter inquestionáveis! As medidas foram tomadas depois de reportagens divulgadas, inclusive, pelo programa “Fantástico”, da Rede Globo, envolvendo a Arquidiocese da Paraíba.

No entanto, esses não são crimes atribuídos apenas a membros da igreja católica. É sabido que em outras instituições fatos dessa natureza são praticados na maioria em nome de Deus! São atribuídos a pastores evangélicos, por exemplo! O fato é que a degeneração sempre esteve entranhada na humanidade, independente da sua formação acadêmica ou religiosa. Infelizmente a pouca escolaridade ou a falta dela e de leitura, gera desconhecimento, ignorância para a maioria da população e dessa forma a facilidade se torna maior para os abusadores, predadores da inocência involuntária!

Mas nem tudo está perdido! A apresentação e devida investigação das denúncias por parte da imprensa e as medidas agora anunciadas pela igreja, reforçam a confiança de que todos são humanos e ninguém (nem a igreja) deverá estar acima das leis! Médicos tidos como profissionais respeitáveis, juízes federais ou não, profissionais que se achavam intocáveis acabaram descobrindo que mais cedo ou mais tarde terão de responder pelos seus atos! Em alguns casos essas leis ainda necessitam de ajustes – como é o caso de juízes flagrados em transgressões – mas ai é um assunto para outro comentário!

Mas voltando a igreja católica e os atos em questão, as recomendações vão mudar ainda a dinâmica de atividades de grupos e pastorais que atendem a esse público. Além de proibir que os sacerdotes fiquem a sós com os menores, não é permitido que as paróquias ofereçam alojamentos a menores e adultos vulneráveis sem a presença dos pais ou responsáveis. Já com relação aos atendimentos espirituais, a exemplo de confissões, o ato deve ser feito dentro dos confessionários ou em locais adequados no interior das igrejas, desde que garantam a segurança e visibilidade.

Apesar de todas as denúncias que ainda estão sendo apuradas, não se pode perder a fé e o respeito a instituição. Como já falei acima, em outras palavras, as maçãs podres não podem contaminar todo o cesto e, as medidas adotadas pela igreja, em particular aqui na Paraíba, apesar de, por um lado, expor a instituição, por outro demonstra claramente que esta não colabora com tais atos e garante punir envolvidos. É também dessa forma que vê o bispo da Diocese de Cajazeiras, Dom Francisco de Sales, ao lamentar que a Arquidiocese da Paraíba esteja envolvida em todo esse imbróglio.

Ao comentar sobre o assunto em um programa de TV do Alto Sertão, Dom Francisco disse que um dos desafios da igreja diante do escândalo que repercutiu nacionalmente é fazer com que as pessoas não atribuam à própria igreja um aspecto de “agência de delinquência”.

“Há um grande sofrimento eclesial institucional e a instituição não pode ser simplesmente culpada por realidades que muitas vezes fazem parte da natureza complexa das pessoas, do ponto de vista até de patologias seríssimas. Mas a Igreja tem feito um esforço muito grande de purificação de si mesma e de enfrentamento dessa realidade”. Disse.

No entanto uma coisa chama a nossa (digo minha) atenção: a frase do vigário geral da Arquidiocese Metropolitana da Paraíba, padre Padre Luiz Júnior quando afirmou que “a determinação para que os padres não fiquem sozinhos com crianças, adolescentes e adultos com deficiência é algo que já faz parte das recomendações, mas agora é um reforço para os sacerdotes”.  Então quer dizer que a Igreja já tinha, desde a muito, conhecimento dos possíveis abusos?

Fonte: Polêmica Paraíba
Créditos: Francisco Airton