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CÁSSIO É PASSADO. E JÁ PASSOU: tréplica a Joilton Costa - Por Flávio Lúcio

Sobre a réplica ao meu artigo “A alternativa Cássio”, o jornalista Joilton Costa, com urbanidade, publicou uma réplica que ele intitulou “A Alternativa Paraíba”. Em razão das contestações que fez Joilton, senti-me na obrigação de produzir a tréplica que segue abaixo.
Primeiro, sobre eu ter afirmado que Cássio “forçou uma aproximação política com o então prefeito de João Pessoa”, que Joilton rechaça, afirmando que o que aconteceu mesmo foi o contrário, será necessário apontar os fatos e aprofundar a análise.
O movimento que levou à aliança com Ricardo Coutinho começou bem antes de 2010, provavelmente logo após a primeira derrota de Cássio no TRE, em julho de 2007, por um placar que não deixava dúvidas (5 a 1) a respeito das chances de reversão da decisão no TSE, restando ao então governador ganhar tempo.
Foi logo em seguida que cassistas destacados começaram a defender publicamente a aliança de Cássio com Ricardo Coutinho, acenos que, claro, RC recebeu de bom grado.
Em todas as vitórias eleitorais de candidatos de esquerda, petistas, socialistas, pedetistas, para governos nos estados nordestinos − e nesse sentido a Paraíba era até então o último bastião oligárquico − mostrou-se estratégico a aliança com um dos setores da política tradicional de cada estado nordestino.
Em fevereiro de 2009, Cássio Cunha Lima teve o mandato de governador definitivamente cassado pelo TSE − os motivos discutiremos a seguir − e em seu lugar assumiu José Maranhão.
Com a ascensão de Maranhão, a situação de Cássio se tornou desesperadora: além do desgaste provocado ao longo dos processos que levaram à cassação do mandato (além do caso FAC, Cássio foi também cassado pelo uso eleitoral do jornal A União, além dos rumorosos casos do “envelopes amarelos” e do “dinheiro voador do Edifício Concorde”), Cássio teria de enfrentar a poderosa aliança montada em 2006 (PMDB-PSB-PT) em apoio à candidatura de José Maranhão.
Se mantida, essa aliança teria reunido num único palanque o governo federal, o governo estadual e as principais prefeituras do estado, entre elas João Pessoa e Campina Grande, governadas pelas duas lideranças em ascensão à época, Ricardo Coutinho e Veneziano Vital.
Eu mesmo, como um outsider da política paraibana, fui um crítico da estratégia ricardista, mas o tempo cuidou de mostrar o quanto ela foi acertada, sobretudo porque, em momento algum e sem voluntarismos, RC fez acomodações ou concessões às práticas do que ele chama da “velha política” do patrimonialismo e do familismo, da qual a sociedade estava farta.
O objetivo de ser governador e provocar uma ruptura de alcance histórico na política paraibana foi estabelecido por RC desde que ele sentou na cadeira de prefeito de João Pessoa e tomou as primeiras iniciativas administrativas, demarcando campo desde logo com a visão tradicional de administrar e fazer política.
A montagem de uma chapa de reeleição puro-sangue, em que José Maranhão e o PT tiveram que engolir em seco a candidatura de Luciano Agra a vice, também do PSB, em 2008 − coisa que Luciano Cartaxo não teve a ousadia necessária para fazer em 2016, − era o indício que faltava para que ficasse delineado com clareza meridiana que próximo passo de RC seria a candidatura ao governo estadual, com José Maranhão sentado ou não na cadeira de governador.
Por isso, meu caro Joilton Costa, o que Cássio fez em 2010 foi apenas dar sua contribuição − involuntária, é verdade − para quebrar a hegemonia oligárquica na política paraibana, mas fez isso muito mais em razão de uma necessidade de sobrevivência política.
Cássio apoiou RC porque temia a manutenção da aliança de 2006 porque uma chapa com José Maranhão, para o governo, e Ricardo Coutinho e Veneziano Vital para o Senado, como era o desejo ardente do então governador peemedebista, deixava Cássio em uma posição de extrema dificuldade, restando a ele apoiar a candidatura natimorta de Cícero Lucena ao governo e um palanque sem apelo político algum, talvez, quem sabe, com o Dem de Efraim Moraes, o que abriria uma grande possibilidade de derrota em 2010.
“Corrupção eleitoral”
Joilton Costa tabém contesta a afirmação de que Cássio Cunha Lima tenha sido cassado por “corrupção eleitoral” em 2009. Segundo ele, na realidade o ex-governador foi cassado por “conduta vedada a agente público”, por executar “programa social sem observar a previsão legal.” Uma banalidade. Infelizmente, Joilton mudou logo de assunto e não detalhou os motivos pelos quais ele e Cássio consideram injusta a decisão do TRE-PB e do TSE. Em razão disso, seremos obrigados aqui a retornar a eles.
O art. 299 do Código Eleitoral define assim corrupção eleitoral: “Dar, oferecer, prometer, solicitar ou receber, para si ou para outrem, dinheiro, dádiva, ou qualquer outra vantagem, para obter ou dar voto e para conseguir ou prometer abstenção, ainda que a oferta não seja aceita”.
Só relembrando, no caso do processo que levou à cassação do então governador Cássio Cunha Lima, através de um programa apelidado de “Ciranda de Serviços”, a Fundação de Ação Comunitária (FAC) distribuiu R$ 35 mil cheques (TRINTA E CINCO MIL CHEQUES), num valor total de R$ 3,5 milhões, recursos oriundos de um Fundo de Combate à Pobreza. Segundo consta na página do próprio TSE (https://tse.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/120541428/recurso-ordinario-ro-1497-pb), Cássio Cunha Lima foi condenado por:
“Utilização de programa social para distribuir recursos públicos, mediante a entrega de cheques a determinadas pessoas, visando à obtenção de benefícios eleitorais. “Ausência de previsão legal e orçamentária para distribuição dos cheques”
“Inexistência de critérios objetivos para escolha dos beneficiários;”
“Concessão de benefícios de valores elevados a diversas pessoas que não comprovaram estado de carência.”
“Uso promocional do programa social comprovado; participação do Governador no projeto `Ciranda de Serviços’, associado à distribuição de cheques, no qual atendia pessoalmente eleitores em diversos municípios do Estado;”
“Envio de foto do Governador junto com os cheques distribuídos;”
“Utilização de imagens do Governador na propaganda eleitoral gratuita do então candidato à reeleição.”
“Elevação dos gastos com o `programa’ às vésperas do período eleitoral.”
“Potencialidade da conduta; quantidade de cheques nominais e de recursos públicos distribuídos suficiente para contaminar o processo eleitoral, determinando a escolha de voto dos beneficiários e de seus familiares. ”
Segundo o relator da ação no TSE, Eros Grau, Cássio Cunha Lima se valeu do programa assistencial para obter benefícios eleitorais. “Não há somente conduta vedada a agente público neste caso, mas largo e franco abuso de poder político e econômico”, declarou Eros Grau à imprensa logo após o julgamento.
Se Cássio não fosse governador e candidato que concorria à reeleição no cargo as ações descritas acimas seriam tipificadas ou não como corrupção eleitoral? Compra de voto, para ser mais direto.
No caso, é muito mais grave porque os recursos e os meios utilizados, como acentuou Eros Grau acima, foram públicos e com a intenção era obter benefícios eleitorais.
No programa “Ciranda de serviços”, os servidores da FAC faziam, em muitos casos, reuniões públicas onde potenciais eleitores apresentavam suas “reinvindicações” − pagamento de contas de luz, água em atraso, planos de saúde, TV a cabo, etc. Anotada, a “reivindicação”, esta era encaminhada à Casa Civil do Governador para fosse emitido um cheque a ser encaminhado ao endereço do solicitante. Com um panfleto da campanha de Cássio no interior.
Notem que a distribuição de recursos públicos era feita sem nenhum tipo de cadastro prévio e de critérios socioeconômicos que estabelecesse um público alvo, o que é vedado pela lei eleitoral. Bastava pedir. E isso em ano de eleição. Até festival de repentistas foi pago com recursos do fundo de combate à pobreza.
O mais absurdo e revelador, não apenas de como determinados setores da política antes se assenhoreavam do Estado e dos recursos públicos para obterem vantagens pessoais é que, enquanto os mais pobres recebiam cheques em valores baixos, aliados políticos do governador embolsavam gordas somas de até R$ 56 mil reais para pagamento de caríssimos tratamentos de saúde.
Uma das beneficiárias foi a esposa do atual presidente do PSDB da Paraíba, o ex-deputado federal Ruy Carneiro, Maria Emília Mendonça Ferreira, que era à época funcionária do TRT − hoje ela é funcionária do gabinete de Cássio − e recebeu uma ajuda de R$ 10,9 mil do Fundo de Combate à Pobreza para um implante dentário.
Como Ruy Carneiro e a esposa, coitados, não tinham o recursos para pagar o tratamento, não restou outra alternativa se não transferir a conta aos paraibanos, e a Casa Civil do Governo do Estado fez esse favor a Ruy.
A Paraíba era mesmo uma festa! Pra poucos.
E só isso basta em termos de comparação.

Fonte: Flávio Lúcio
Créditos: Flávio Lúcio