ANATOMIA

Educadoras sexuais imprimem seus Clitóris em 3D para o mundo inteiro com projeto de conscientização

Essa coisinha fofa que parece ter pescoço-braços-peitos é um clitóris. Nunca mais o subestime: é bem maior que uma ervilha, mais potente que qualquer pênis, responsável por todos os orgasmos femininos. Ao longo da História, ele foi ignorado pela medicina e condenado por religiões.

Essa coisinha fofa que parece ter pescoço-braços-peitos é um clitóris. Nunca mais o subestime: é bem maior que uma ervilha, mais potente que qualquer pênis, responsável por todos os orgasmos femininos. Ao longo da História, ele foi ignorado pela medicina e condenado por religiões. Ainda hoje, segue desconhecido entre as pernas de algumas e minimizado pela vaidade de alguns.

Por que? A pedagoga Caroline Arcari e a jornalista Julieta Jacob, ambas educadoras sexuais, inventaram um jeito bem prático de discutir isso aí. Tiraram o órgão do alto da vulva e botaram todinho em cima da (s) mesa (s). Literalmente: imprimiram em 3D, tão vendendo moldes no Brasil e começando a exportar para países como Portugal e Itália.

As duas são idealizadoras do Clitóri-se, um projeto/site para promover a conscientização das mulheres sobre seu corpo, prazer e saúde sexual. “A soberania sobre o próprio corpo é, sobretudo, um ato político”, acreditam. Na entrevista a seguir, elas falam sobre questões anatômicas do clitóris e como sua presença repercute na sociedade e na nossa intimidade.

– O clitóris é muito maior do que o botãozinho visível no alto da vulva. Vocês podem descrever a anatomia e as características dele?

O botãozinho é só “a pontinha do iceberg”, a parte visível (glande e prepúcio) que dá para tocar e estimular diretamente. Ele enrijece quando a mulher tá excitada, é super sensível graças às oito mil terminações nervosas, mais que o dobro da quantidade presente no pênis. Mas a maior parte do clitóris é interna – composta por tronco, corpos cavernosos, raízes e bulbos – e mede cerca de 10 cm, rodeia a entrada da vagina e pode ser estimulada indiretamente durante a penetração vaginal.

– Por que isso só foi “destrinchado” pela medicina em 1998? O que esse desconhecimento significou ao longo dos últimos séculos?

O clitóris é conhecido desde o século 16. Acreditava-se que ele tinha relação com a gravidez, mas assim que essa hipótese foi descartada, ele chegou a ser apagado do livro referência em anatomia. O clitóris chegou a ser chamado de “teta do diabo”, associando o prazer da mulher à ideia de pecado, o que inibiu ainda mais a masturbação feminina. Freud e sua teoria do “orgasmo maduro” colocaram a vagina como centro do prazer. Hoje sabemos que o canal vaginal é pobre em terminações nervosas (e quanto mais fundo, menos sensível). Apenas 30% das mulheres dizem atingir o orgasmo pela estimulação simples da vagina, enquanto as demais se sentem frustradas. Só que mesmo o orgasmo dito “vaginal” ocorre por meio da parte interna do clitóris.

– Vocês concordam que até hoje muitos homens ignoram ou minimizam a existência do clitóris? Me parece que não sabem o quanto ele é responsável pelo orgasmo das mulheres.

Eles também aprenderam errado sobre a sexualidade das mulheres, afinal, onde está a nossa educação sexual senão na pornografia machista? Os homens sabem que gozam estimulando a glande do seu pênis dentro da vagina. Só que a penetração dificilmente possibilita o orgasmo da mulher – ela precisa de estimulação simultânea do clitóris externo (com a mão, por exemplo). Qual a chance de um homem gozar apenas com carícias no saco? É a mesma coisa de estimular somente a vagina! E sem crise, por favor: homens, o pênis de vocês é importante. O clitóris também.

– Aliás, infelizmente as mulheres também não exploram essa belezura. Como esse distanciamento do próprio clitóris impacta no sexo?

Esse distanciamento não só tem impacto no sexo, mas no prazer sexual que pode ser obtido durante a masturbação. Para muitas mulheres, o clitóris é a fonte mais consistente de orgasmo. Conhecê-lo pode trazer grande satisfação consigo mesma e com o (a) parceiro (a), que pode ser guiado na relação sexual.

– Ao contrário do pênis e da vagina, o clitóris não é um órgão com finalidades reprodutivas. Sua única função é proporcionar prazer. Esse fato perturba algumas culturas/sociedades, né?

O fato de o clitóris ser tão pouco conhecido está ligado ao controle dos corpos, sexualidade e dos direitos reprodutivos das mulheres e meninas. A Mutilação Genital Feminina (MGF), por exemplo, é uma violência de gênero que remove parcial ou totalmente a genitália feminina externa (ou provoca outras lesões) por razões não médicas. É um ato de tortura cruel e desumano. Embora a MGF não seja uma realidade no Brasil, há outra forma de mutilação genital por aqui. Crianças intersexo, que nascem com genitália ambígua, são submetidas a cirurgias e procedimentos desnecessários para “adequar” sua aparência ao estereótipo tradicional – masculino (pênis e testículos) e feminino (vulva e vagina).

– Qual o objetivo de vocês ao trazer pro Brasil a produção e comercialização do modelo anatômico do clitóris em 3D? Que tipo de público tem se interessado em comprar a peça?

Os modelos anatômicos de genitais disponíveis no Brasil não mostram o clitóris como um todo. Sabemos como é importante conhecer seu corpo e sua fisiologia. O Clitorínea, em 3D, é um recurso didático que também pode motivar os profissionais de saúde e educação para uma abordagem atualizada sobre o corpo e o prazer feminino – além de quebrar tabus em relação ao órgão. Também temos clientes que compram como objeto pessoal, para decoração e até como um símbolo de reconhecimento e autonomia sobre o próprio prazer.

Fonte: NA PIMENTARIA