80% ainda não tem candidato definido

A ELEIÇÃO DAS MULHERES: Datafolha diz que elas vão decidir quem vencerá nas urnas

Segundo Datafolha, 46% das mulheres querem mais atenção com a saúde

A mais indefinida corrida eleitoral desde a redemocratização terá seu desenlace quando o enorme contingente que ainda não escolheu o seu candidato aderir a um dos postulantes ao Planalto. Por enquanto, as pesquisas ajudam a clarear quem são — e o que querem — os indecisos. É na população feminina que se concentrará essa disputa. Maioria (52,5%) dos eleitores, as mulheres são também as mais indecisas e resistentes em escolher o próximo (ou próxima) presidente: nada menos que 80% não têm qualquer candidato (54% indecisas e 26% declararam voto branco ou nulo), segundo pesquisa Datafolha de junho, com resposta espontânea. Entre os homens, esse índice é de 58%. Nas últimas quatro eleições, nesta época do ano, esta taxa nunca foi tão alta entre as mulheres, tendo variado entre os 49% de indecisas em 2006 e os 72% em 2014.

As duas últimas das 18 perguntas da mais recente pesquisa Datafolha de avaliação do governo Temer jogam luz sobre o que elas querem: à questão “qual deve ser a prioridade do presidente eleito”, 46% das mulheres responderam saúde, mais do que a soma das opções seguintes, educação (18%), desemprego (8%), segurança (5%) e economia (3%). No eleitorado masculino, saúde liderou, mas com 35% das respostas. Na pergunta sobre o principal problema do país, saúde liderou as respostas entre as mulheres (19%), mas, entre os homens, a corrupção ficou em primeiro (21%).

A demora das mulheres em encontrar o candidato pode ser resultado também da dissonância entre o que elas querem e o que lhes é oferecido. O GLOBO enviou perguntas sobre como atrair o eleitorado indeciso feminino aos cinco pré-candidatos mais bem colocados nas pesquisas (à exceção do ex-presidente Lula, que está preso). A área de saúde praticamente não foi citada como parte das propostas.

TENDÊNCIAS ANTECIPADAS

Nos cenários estimulados, com os nomes dos candidatos, 41% das mulheres seguem sem um escolhido, ante 25% dos homens. Em números absolutos, são 25,5 milhões de eleitoras declarando pretender votar nulo, branco ou “em ninguém”. Além dessas, outras 6,1 milhões estão indecisas — contra 1,5 milhão de homens nessa situação, uma proporção de quatro para um. Fatia mais do que suficiente para decidir a eleição. Em 2014, Dilma Rousseff venceu Aécio Neves por 3,4 milhões de votos.

O QUE PENSAM AS MULHERES AINDA INDECISAS

Cláudia moreira, 52 , produtora de eventos, Duque de caxias: “Não encontrei um candidato em quem confie. Os discursos são prontos, mas as ações, inexistentes. Quero um candidato que tenha realizações anteriores para mostrar um olhar humano ao povo. Tem de fazer políticas públicas para as classes baixas. A saúde está em calamidade, e a educação é a base de tudo.” Foto: Ana Branco / Ana Branco / Agência O Globo

  • Marinês Gonçalves, 42, trabalhadora rural, sinop (MT): “O mais importante é a saúde, a educação e a agricultura. Não vou votar. É melhor do que votar numa pessoa que, quando você precisar, não vai estar lá. Não tem um serviço público que preste. Uma vez fui ao hospital e me trataram mal dizendo que não tinha estrutura e que estavam com três meses de salário atrasado. É culpa da política” (Marco Stamm).Foto: Marco Stamm

  • Rosane Rempel, 50 , advogada, Porto Alegre: ” Ela mantém suas esperanças nas novas gerações, que, acredita, buscam melhorias coletivamente.“Se eu votasse, não escolheria um candidato que faz do poder sua profissão, sem ao menos saber o que é uma jornada de trabalho de oito horas ou mais para ter de sobreviver com um salário mínimo”. (Patrícia Comunello)Foto: Joao Mattos

  • Elisabeth Galdino, 61 , educadora, Natal (RN). Desde que tirou o título de eleitor, aos 18 anos, Elisabeth Galdino sempre votou. Trabalha na área da educação, a mesma que acreditar ser prioridade. “Se eu não votar sinto que sou incapaz de reclamar por direitos. O mais importante em um candidato é priorizar a educação. A partir dela, tudo se transforma”. (Aura Mazda)Foto: Aura Mazda

  • Christina Oliveira, 42 , dona de salão, São Paulo: “Vi minha família melhorar de vida através de políticas sociais. Sou muito atenta a isso”, diz. Ela vê esta eleição como a mais difícil para escolher. “Estou muito atenta às fake news. Observo muito o que as pessoas ao meu redor falam dos candidatos e sempre busco qualificar as conversas com os clientes no salão”. (Tiago Aguiar) Foto: Marcos Alves / Agência O Globo

  • Luciane Medeiros, 32, auxiliar de cozinha, Natal (RN). Ela sustenta a família de seis pessoas com dois salários mínimos, o dela e o do pai. Não vota em nenhum candidato há oito anos, e, desiludida, está decidida a anular. Onde mora, o único posto de saúde público está fechado há mais de seis meses. “Já cansei de ouvir promessa de candidato em época de campanha na porta da minha casa. É tudo ilusão”. (Aura Mazda).Foto: Aura Mazda

  • PA Eleições 2018 – Priscila Leote – Mulher Gay. Foto Joao MattosFoto: Joao Mattos / Joao Mattos

  • Ellen Neto, 30 anos, engenheira agrônoma, Sinop (MT): “Antes de escolher, procuro saber o que o candidato já fez e se não está enrolado com corrupção, o que é difícil atualmente. Ainda estou em dúvida. Como mulher e negra, vejo que não tem muito trabalho para nós. Procuro um candidato que atenda, não só as minhas necessidades, mas de toda a comunidade negra. (Marco Stamm) Foto: Marco Stamm

  • Eleonora Coelho, 44 , advogada, são paulo. Busca honestidade e valores como diversidade e inclusão social. Para ela, o desenvolvimento econômico é intrínseco ao respeito às mulheres. “Acho que há oportunismo de alguns. Temos que ter muita cautela para identificar o que é ação concreta, o que são os planos efetivos”. (Tiago Aguiar).Foto: Marcos Alves

  • Júlia guerra, 29 anos, economista, Rio de Janeiro: “Quero um candidato comprometido com reduzir as desigualdades. As reformas econômicas (trabalhista, tributária) têm de ser um meio para se reduzir a desigualdade de oportunidades, não um fim em si. Estou esperando também porque posso decidir por um voto útil, para evitar que um candidato não vá ao segundo turno”.Foto: Roberto Moreyra / Agência O Globo

O GLOBO ouviu dez eleitoras indecisas em cinco estados na última semana. Além de seus depoimentos, a análise de especialistas em pesquisas e eleições facilita entender por que há diferenças marcantes de gênero no comportamento eleitoral. A condição de usuária mais frequente dos serviços públicos, incluindo a saúde, sobretudo se há crianças sob seus cuidados, explica a preocupação das mulheres em relação à área, aponta a socióloga Fátima Pacheco Jordão. Segundo ela, especialista em comunicação política com ênfase em gênero, a necessidade da mulher em debater a “vida real” faz com que ela só comece a se envolver na eleição a partir da propaganda de rádio e TV.

É na comunicação da massa, explica Fátima, que os problemas do cotidiano são debatidos pelas campanhas. Com isso, a proporção de indecisas diminui ao longo da corrida, mas permanece superior à dos homens até as vésperas da votação:

—De 65% a 75% dos indecisos ou que declaram o não voto, nos últimos dois ou três dias antes do segundo turno, são mulheres. Por isso, são elas que decidem as eleições. E os estrategistas sabem disso: na reta final, intensificam a linguagem com o código feminino. A inflação é tratada no contexto do consumo de alimento, grávidas ganham espaço na propaganda.

Diretor do Datafolha, Mauro Paulino diz que os números corroboram essa avaliação e formula uma noca explicação para a saúde ser mais citada por elas.

— As mulheres têm assumido papel de protagonismo na elaboração do voto pelos homens. A tendência do voto feminino acaba se reproduzindo depois, nas pesquisas seguintes ou na eleição — explica Paulino. — A saúde aparecer à frente não surpreende. Um problema de saúde, especialmente em famílias mais pobres, para quem o atendimento é pior, frequentemente é algo grave, pode morrer alguém. É algo que fica muito marcado na pessoa, mais do que ter sofrido assalto ou perdido emprego.

A cientista política Hannah Maruci, do Grupo de Estudos de Gênero e Política da USP, destaca que as ações voltadas para as necessidades femininas são as primeiras a serem sacrificadas nos cortes orçamentários, o que poderia explicar o descontentamento das mulheres com o cenário atual. O rebaixamento da Secretaria de Políticas para as Mulheres, que perdeu status de ministério, é simbólico:

—Elas sentem o peso maior da crise e do desemprego. É quando a violência, inclusive doméstica, aumenta.

O QUE PROPÕEM OS PRESIDENCIÁVEIS

Jair Bolsonaro (PSL) vê seu desempenho cair de 26% entre os homens para 12% entre as mulheres no cenário sem Lula. Ele acredita que as mulheres “têm sensibilidade maior que a dos homens”, o que explicaria a decisão do voto por último, e diz que sua candidatura deve ir bem nesse segmento pois representa melhor os “valores familiares e de segurança”.

Ciro Gomes (PDT), que cai de 12% entre os homens para 8% entre as mulheres, promete formar um ministério “50% feminino”. O pedetista planeja revogar o item da reforma trabalhista que permite o trabalho de gestantes em ambientes insalubres, ampliar número de creches, combater desigualdade salarial e melhorar a “atenção à saúde da mulher”. A assessoria do candidato deu como exemplo de problemas a demora em se ter diagnóstico de câncer de mama na rede pública.

Geraldo Alckmin (PSDB) — com iguais 7% entre homens e mulheres — defende “ampliação da participação da mulher no mercado de trabalho, nas eleições e em espaços políticos”. E promete trabalhar por “ações que assegurem isonomia de remuneração no serviço púbico e na iniciativa privada”. Alvaro Dias (Podemos) varia de 5% entre os homens para 4% no eleitorado feminino e quer “implantar políticas para eliminar desvantagens da mulher” e “monitorar leis de proteção”.

Fonte: O Globo
Créditos: O Globo