O pior mesmo é saber que a equipe do governador envolvida no episódio pode ter botado a perder uma investigação séria que a Polícia Federal adoraria fazer

Pegadinha

DANTAS

Inteligente até dizer basta, Ricardo Coutinho (PSB) não deve ter tomado conhecimento antecipado e por inteiro dos procedimentos e elementos da denúncia que sua assessoria fez anteontem em João Pessoa sobre a ‘compra de prefeito’ do interior pela campanha de Cássio Cunha Lima (PSDB). Acredito mesmo que o governador desautorizaria e abortaria a operação, que consistiu numa pegadinha telefônica onde um ex-secretário de Estado se passa por uma terceira pessoa e tenta fechar um pacote de adesões com um suposto prefeito, que estaria se vendendo junto com o seu vice e quatro vereadores à candidatura do senador tucano ao Governo do Estado.


Uso o termo ‘suposto’ porque no próprio áudio divulgado pela coligação do governador (áudio que abri e ouvi no Portal Wscom) sequer o nome do prefeito ou da cidade é citado. Nas histórias de arapongagem que se conhece por aí, em armações do gênero espera-se no mínimo que o autor da ligação fale o nome do interlocutor e o induza a confirmar – pra ele e o resto do mundo – que se trata realmente de Fulano ou Sicrano com quem está conversando. Não, não estou esquecido que o pretenso alcaide cita nomes de vereadores e o nome de ‘Ricardo Marcelo’, em tese o presidente da Assembleia Legislativa, que segundo a voz do outro lado da linha estaria “a par de todo o proj
eto”. Mas entendo que isso tenha pouca ou nenhuma serventia como prova capaz de comprometer o adversário. Afinal, nesse vale-tudo vale até mesmo combinar uma conversa do gênero com outra pessoa e aí seriam dois, e não apenas o ex-secretário, que estariam cometendo o crime de falsa identidade. Punível, aliás, com detenção de três meses a um ano, além de multa. Pena leve do nosso leniente Código Penal.
Juntando tudo isso, o que se sabe até aqui do possível desastre é suficiente para inscrever a tal denúncia no rol das pantomimas sem graça. Até por que não faz justiça à fama de esperteza de quem provavelmente a idealizou, além de insultar a Inteligência de quem dela tomou conhecimento. O pior mesmo, contudo, é saber que a equipe do governador envolvida no episódio pode ter botado a perder uma investigação séria que a Polícia Federal, a Justiça e o Ministério Público Eleitoral adorariam empreender. Poderiam, bem que poderiam, se os autores da denúncia tivessem tratado o assunto com sobriedade, dando-lhe pelo menos o caráter de suspeita de corrupção eleitoral. Aí, em vez do circo midiático e talvez completamente inútil que montaram na Associação Paraibana de Imprensa (API), ainda por cima para publicizar uma gravação clandestina, teriam entregue o caso à apuração competente e qualificada das instituições mencionadas.
Valdo não merece

Até onde me foi dado conhecer o causo, penso que Sales Dantas, o ex-secretário de governo que assumiu a autoria da ligação para o ‘prefeito’ comprável, foi particularmente infeliz quando se apresentou como Valdo Tomé nas ‘negociações’. O verdadeiro Valdo Tomé conheço desde quando tive a felicidade de pedir o seu voto nas eleições que disputei e venci para Presidente da API, em 1987. Ao longo dos últimos 27 anos, jamais soube de qualquer coisa que desabonasse a imagem desse fiel e competente colaborador dos Cunha Lima. Tenho a mais firme convicção de que o caráter e o temperamento de Valdo jamais o deixariam envolver-se em algo do gênero. Daí por que a escolha de seu nome para dar credibilidade a um personagem falso de uma trama rasteira foi absurdamente despropositada, além de injusta.

 

Derrota no TCU

O Governo do Estado perdeu mais uma para os procuradores de carreira do Estado. Dessa vez, por 2 a 0. No Tribunal de Contas da União (TCU), que publicou ontem no Diário Oficial da União acórdão no qual rejeita recurso impetrado pela Procuradoria Geral do Estado contra decisão anterior, de 5 de maio deste ano, que obriga a atual administração a submeter exclusivamente ao exame de membros da PGE, para emissão do competente parecer, os contratos, convênios e licitações que envolvam recursos federais.
O resultado do julgamento de agora é consequência de ação ajuizada pela Associação Nacional dos Procuradores dos Estados e do Distrito Federal (Anape) e Associação dos Procuradores do Estado da Paraíba (Aspas-PB). As entidades foram à Justiça e a órgãos como o TCU em defesa das prerrogativas dos procuradores estaduais, extrema e continuadamente desrespeitadas pelo Executivo Estadual, que entrega a análise de seus atos à apreciação de assessores comissionados.

Em nota divulgada também ontem, Sanny Japiassu, presidente da entidade local, lamentou que o governo busque “protelar o cumprimento de uma garantia já assegurada pelo próprio TCU”. Ela garantiu, contudo, “que os procuradores do Estado da Paraíba se mantêm vigilantes e dispostos a assegurar as suas prerrogativas, em todas as instâncias” e estranhou que nesse caso o procurador-geral Gilberto Carneiro tenha recorrido de uma medida “que a própria administração estadual já tinha determinado o seu cumprimento”.
Referiu-se ao fato de que no final de maio passado o então controlador-geral do Estado, Luzemar Martins, encaminhou ofício circular a todas as secretarias e órgãos da administração direta e indireta do Governo da Paraíba “determinando que os pareceres jurídicos relativos a contratos, licitações e convênios celebrados com recursos da União, sejam executados, exclusivamente, por procurador do Estado de carreira, em atenção à decisão do TCU, através de sua 1ª Câmara”. Já o presidente da Anape, Marcello Terto, explicou que a decisão tomada em Brasília “anula os pareceres de assessores jurídicos comissionados em relação a convênios federais”, o que pode redundar em grandes e graves prejuízos para o Estado e os programas financiados com recursos da União.